Deixando o Chile, entrando na Bolívia, propina a vista !
Partimos do Deserto do Atacama maravilhados com as paisagens, um cenário que nos deixa perplexo pelas formações geológicas. Alguns lugares ficaram para uma próxima visita a região, afinal estas paisagens podem ser exploradas de várias formas. Seguimos para o litoral e paramos para dormir em Tocopilla. A cidade conta com uma central elétrica que fornece energia para outras cidades do norte do Chile. O município é tranqüilo, está encostado numa grande montanha arenosa e muitos moradores de dedicam a atividade pesqueira.
Como não havia muito que conhecer, acordamos e seguimos viagem, agora pela costa do Pacífico. No caminho, nos chamou a atenção pessoas nas praias carregando carros, camionetas, caminhões, com uma espécie de vegetação negra. Fiquei curioso, parei para observar o que era e me aproximei de alguns catadores e logo vi que eram algas marinhas. Com as fortes ressacas e as ondas constantes no litoral, as algas se soltam das encostas e vão parar nas praias.
Moradores pegam toda esta alga e vendem para atravessadores que exportam para países da Ásia para a fabricação de xampu e remédios. Os catadores recebem pelo material bruto um valor de 150 dólares por tonelada. Conversei com o Manuel que fazia a coleta com a sua família e me forneceu informaçòes do processo e venda. Seguimos viagem e depois de algumas horas chegamos a Iquique, uma zona franca no litoral chileno, com shopping e aquela tranqueirada de sempre. A ZOFRI (Zona Franca de Iquique) é uma “Ciudad de Leste” melhorada e com praia. É claro que a cidade tem seus atrativos, lojas, uma bela orla e ondas para quem gosta de surfar em águas bem geladas. A cidade também tem um certo perigo, na minha passagem anterior por Iquique, estávamos a bordo de um jipe e tivemos o estepe furtado num estacionamento perto da praia. Muito cuidado onde estacionar o veículo, pois há trombadinhas de olho em visitantes desavisados. O que mais nos impressionou dessa vez, foi uma tempestade de areia que chegou de repente, por volta das 3 da tarde, a cidade ficou escura e da cor sépia. Uma cena assustadora, todos os carros parados ficaram cobertos de areia, inclusive o nosso. O sol foi coberto por uma nuvem de pó que parecíamos estar em Marte, realmente uma situação bem atípica, pois até os moradores locais ficaram assustados.
Durante a noite todos os canais de televisão mostraram aquela cena, procurando explicações para o fenômeno, pudemos rever as imagens nos telejornais. Na câmera de vídeo a imagem ficou laranja, parecia que a câmera estava desregulada, nunca havia presenciado um fenômeno deste antes. Outra característica interessante de Iquique é a quantidade de autopeças, desmanches e lojas de carros usados. A cidade ficou conhecida por receber pelo porto carros rejeitados de países de primeiro mundo, por não passarem no teste de emissão de poluentes. Sendo assim, bolivianos, paraguaios e peruanos vão para Iquique e compram estes carros usados com mais de 5 anos de fabricação e pagam preços bem abaixo do valor de mercado. Os veículos são levados para seus países de origem onde as leis ambientais são menos rigorosas e aceitam a circulação deles. Passamos pela região histórica da cidade e também fomos até o porto onde lobos marinhos passam o dia nas escadas de embarque local. No horizonte, milhares de containers estocados nos armazéns. Outro atrativo interessante é uma caravela totalmente restaurada, que funciona como um museu e vale a visita, está bem ao lado da entrada do porto.
Nossa passagem por Iquique foi rápida e na seqüência fomos para Arica, a última cidade ao norte do território chileno, também no litoral gelado do Oceano Pacífico. Em Arica conhecemos um casal de alemães que faziam o caminho inverso da nossa travessia, vinham dos Estados Unidos e seguiam para Ushuaia. O mais interessante e ao mesmo tempo complicado é que eles viajavam com um cachorro da raça Golden Retriever e tiveram muitos problemas nas fronteiras para entrar com o animal. Trocamos algumas informações sobre estradas e travessias marítimas e fomos até a praia onde milhares de aves marinhas faziam revoadas espetaculares sobre as praias. Em Arica nosso botijão de gás acabou e tivemos que abandoná-lo na revenda de gás, pois a partir dali não tínhamos mais como recarregá-lo com gás e não havia espaço para dois botijões em nosso carro. Compramos um botijão chileno, já que o padrão era o mesmo do Peru e Equador.
De qualquer forma o nosso consumo médio é baixo, um botijão dura cerca de dois meses e nossa próxima troca deverá ser no México ou Estados Unidos. Feito a troca, deixamos o litoral entramos na estrada em direção a Bolívia, um dos países problemáticos de nossa travessia. A viagem até a fronteira foi impressionante e deserta, fizemos uma parada na cidadezinha de Putre, ainda no Chile, apenas uma praça e meia dúzia de ruas. Almoçamos bem no único restaurante turístico da cidade, o Cantaverdi, gostoso e charmoso, com uma decoração rústica e original. Voltamos para a estrada principal que neste ponto já passava dos 3 mil metros de altitude. Nesta região está o Parque Nacional Lauca, e a principal atração é o belíssimo Lago Chungará, com 4.517 metros, rodeado pelos vulcões Parinacota, Sajama e Guallatire.
Seguimos bordeando lagoas com vulcões ao fundo e ao longo de todo o caminho observamos muitas lhamas e vicunhas. À medida que nos aproximávamos da Bolívia, aumentava o número de caminhões vindo nos dois sentidos, bolivianos e chilenos levando produtos de um país para o outro. A estrada tem alguns trechos de asfalto e outros de muito rípio, pedra e poeira de sobra. Como algumas partes estão sendo asfaltadas há muito “pare” e “siga” devido aos trabalhos na pista. Aos poucos nos aproximamos da fronteira e já avistamos um caos de caminhões em filas enormes, não havia espaço para entrarmos, fui costurando, andando na contramão até chegar ao posto onde deveria apresentar a documentação nossa e do veículo. Nosso pressentimento sobre as passagens fronteiriças da Bolívia se confirmou logo no primeiro contato.
Um guarda da fronteira com uma cara de poucos amigos me leva para uma sala enquanto a Letícia aguarda apreensiva no carro. O policial foi bem direto, se não pagar não passa. Logo vi que ele não cederia mesmo e considerando que o valor do suborno é baixo, vale mais dar o dinheiro que se estressar tentando dar lição de moral no sujeito. Coloquei uma nota de 10 dólares na gaveta, ele fechou rapidamente e peguei os documentos já carimbados e registrados. Lá fora um bate boca entre um caminhoneiro e um policial deixa a situação ainda mais tensa. Entramos rapidamente no carro onde pessoas estranhas olhavam nosso motorhome como um OVNI, hora de escapar dali em direção a La Paz. Difícil é descobrir o caminho, não tínhamos mapas daquele trecho, o GPS a essa altura já não marca mais, pelo menos dá a direção e a distância ao destino em linha reta. As estradas da Bolívia não estão cadastradas no nosso GPS. As paisagens dentro da Bolívia continuam desertas e incomuns, grandes rochas, montanhas e planícies extensas. Aos poucos o sol foi sumindo e ficamos preocupados por ter que andar em estradas dentro da Bolívia durante a noite, mas os atrasos na fronteira foram cruciais. Passamos pelo povoado de Tambo Quemado e chegamos na cidade de Patacamaya mas a situação era crítica, não havia luz nas ruas, muita gente andando na beira da estrada, não conseguimos visualizar um lugar seguro para dormir e resolvemos seguir até a capital La Paz. A viagem foi tensa, vimos alguns acidentes, uma pista simples e sem sinalização, onde motoristas disputam cada metro na buzina e na intolerância. Aos poucos chegamos ao município de El Alto, localizado no topo de La Paz. Um buzinaço e muita gente nas ruas, dezenas de vans e microônibus circulam por todos os lados, agora sim temos a certeza de que estamos na Bolívia. Descemos até o centro da cidade, já era quase 10 horas da noite e procuramos um hotel para dormir, pois sabiamos que La Paz não era um lugar tranqüilo para dormir na rua ou num posto de combustível. Fizemos o check-in no hotel depois de deixar nosso motorhome bem na porta de entrada e fomos dormir, pois só no dia seguinte iríamos andar pelas ruas da capital boliviana.
Category : Diário de Bordo
CARLOS NOETOLD
14 Anos ago
DECIDIDAMENTE, JAMAIS VOU PASSAR PELA BOLIVIA COM MEU MOTORHOME. OBRIGADO POR DESCREVER SUAS IMPRESSÕES.
Quincas
14 Anos ago
Infelizmente esse é o retrato da nossa América Latina.
Guilherme Vilela Starling
14 Anos ago
A muitos anos vejo relatos na internet sobre problemas de travessia na fronteira da Bolívia. Um dos casos foi o de um motociclista (que até foi entrevistado no Programa do Jô). Eles não o queriam no país, depois de muita insistência, lábia, e jeitinho brasileiro, conseguiu convencê-los de deixá-lo apenas atravessar o pais, e com um policial na garupa! rs. Como simplesmente não cabia o policial na moto, eles tiveram de ir se encontrando em hotéis previamente combinados até que ele ultrapassasse a fronteira no lado oposto.
Acredito que grandes mídias de outras nações deveriam fazer pressão sobre o país para evitar esse tipo de propina descarada, não só na alfandega como em toda a Bolívia, afinal, para entrar no país, a primeira coisa a acontecer é ser roubado!
walter lafratta
13 Anos ago
Eduardo, tudo bem? Compramos um motorhome (Renault Master). Fizemos uma viagem para o Atacama há um mês atras e gostamos muito. Eu e a Dedé, minha esposa (irmã do Luis Fernando Cavalca) queremos fazer a mesma viagem que vocês estão fazendo. Estou reformando o motorhome e vou ter que gastar uma boa grana para isso. A pergunta é: dá para ir sem tração nas quatro? O carro é muito bom, não quero trocá-lo, mas preocupo-me com a qualidade das estradas. Qual sua opinião? Manda um email para mim. Estamos acompanhando você por aqui. Um forte abraço e boas andanças!
Lafratta
eduardo
13 Anos ago
Legal Lafrata, esta com certeza será a primeira de muitas viagens que irão fazer, já estão contaminados…………..rs ! Abraços.